Quem nos anos 80 era jovem e bacana tinha um endereço certo na noite: a boate do Recreativo. O que rolava por lá virava notícia nas colunas sociais dos jornais e revistas. E quem comandou nessa fase tanto a música como a ruidosa programação foi o jornalista e DJ Haroldo Pereira Jr., hoje editor da grande mídia e ainda um apaixonado pelas pick-ups. E é justamente Haroldo que volta a boate do Recreativo neste sábado, dia 16, às 22h, para participar do projeto The Club 80, criado pela promoter Samantha Milano e pelo DJ Marcos Mengo na intenção de trazer de volta esses bons e velhos tempos, que, com toda a onda retrô, não deixaram de ser atuais. E para deixar você ansioso para a festa e com gostinho de quero mais, batemos um papo com Haroldo, que falou sobre a festa, a boate e a cena noturna da atualidade.
Como acha que vai ser voltar a tocar na boate do Recreativo após quase vinte anos? Cheguei a tocar em nivers na boate, recentemente, para amigos como o Kim Silva e a Laurici Freitas, além de algumas Monday (tradicional festa para comemorar a chegada do ano) e uma à fantasia divertidíssima, do Marcos Parrula. Mas em uma noite tão direcionada como a The Club 80, é emocionante demais. Tudo que aprendi na vida, aprendi em Guarulhos, tanto ser editor como ser DJ, o que também faço muito nos dias de hoje. Então, tenho essa sensação bacana de voltar para o berço (risos).
Frequentar a boate era estar dentro do burburinho, do que era top. Foram realmente tempos incríveis? Acho que a grande importância da boate foi ser um lugar que deu certo para o melhor público de Guarulhos, pois sempre foi difícil ter um club assim. É o grande orgulho de todos nós que a fizemos. E por contar com os sócios do Recreativo, isso já deu uma base boa. Sempre fomos atrás do novo, do hype mesmo. Quando abriu para o público, em 86, e chamaram eu e a Debora Quiles para dar uma consultoria (pois éramos do Regine´s, em São Paulo), deixamos claro que o estilo tinha que ser o mais up to date. Dançávamos no Madame Satã e no Rose Bom Bom, rock inglês, punk rock, gotic, new jazz… todos de preto, rag jeans e sobretudos. A galera mais tradicional estranhava tanto a atitude como a música. Mas a onda pegou.
Quer dizer que sempre lançaram modas? Sem dúvida! Não tem como negar que a turma da boate, pelo poder aquisitivo, gastava muito em “Foruns, B.o.a.t.s, Zoomps” e brechós selecionados (risos). Quem viajava trazia Gaultier. E a música tinha que seguir isso. Rachamos com a onda rock para voltar ao dance, em 87, com “Kiss”, do Prince, e “Slow Ride”, do Beastie Boys, de um dia para o outro. Aí veio o electronic body music, o acid jazz, a onda clubber, a nova cena inglesa e por aí foi. Na virada para os anos 90, as meninas disputavam quem vinha com a plataforma de salto maior.
E as festas? Muitas! Animadíssimas, badaladas e absurdas. Sempre rolava comissões de jovens sócios e juntos bolávamos festas. Kim e Flavinho Silva, Lu Kriegel, Chico Cantó, Rose Roberto, Macuco… esses foram alguns que participaram. Uma das festas que marcaram foi a do Vermelho e Preto, nos Carnavais, com dress code nessas cores. Era chique, glamurosa. Tinha a do Cowboy, da Máfia, dos Anos 60, e a do Terror. Agora a de Hollywood era a mais esperada. Na primeira, colocamos, com o auxilio luxuoso de Sonia Lago, uma Marilyn Monroe com o vestido esvoaçante logo na entrada. Teve um fashion designer que foi fantasiado como a Daryl Hannah em Blade Runner. Foi um escândalo!
Quais as dez músicas que formaram o set principal da boate nos anos 80? Vamos lá! Em ordem cronológica coloco “In Between Days”, do The Cure, que sintetiza a era pós-punk. Paralelo, “Nanny the Elephant”, do Toy Dolls, um punk rock divertido que pela batida bem humorada conquistou todo mundo. Aí pulo para “Kiss”, do Prince, e “Torch”, do Soft Cell, pensando em 87, trazendo tanto o frescor da reviravolta dance e um novo tecnopop inglês que faria sucesso com Erasure. Aí veio o house, “Pump of the Volume”, do Mars, e “Beat This”, do Bomb the Bass, que simbolizou um novo verão do amor, o de 88, em Londres, vinte anos depois do advento hippie. Aí, no finalzinho da década vem o desbunde da atitude clubber. Tem “Groove in the heart”, com Dee Lite, “Supersonic”, com JJ Fad, “Freedom”, com George Michael, e “Pump of the Jam”, do Technotronic, que criou o termo “poperô” para tudo que é dançante. Mas tem três hits sentimentais da boate: “Our House”, do Madnnes, “Los Ninos e las Ninas”, do Liason Degeneurs e “La Vie en Rose”, com Grace Jones, que era lindo de se ver na hora que tocava. São verdadeiros hinos de quem passou por lá e merecem estar na listinha (risos).
Em relação às décadas passadas, como você vê a música e a cena noturna na atualidade? Claro que a primeira coisa que vem na mente é a internet. A house music, nascida dos recortes musicais colados pelo slamper, um computador bobinho, virou a filha poderosa da disco music. Domina o mundo por anos e vai ser assim para sempre; juntas formaram um universo chamado dance music. Tem lugar para o rap também e um rock indie que quer ser dançante. Existem projetos e DJs incríveis, mas a eletrônica tirou muito da parte viva de fazer música. Vocais e percussão são coisas do passado. Por isso que a nova geração gosta dessa cena retrô: sai da mesmice digital. Agora, a noite continua sendo a irresistível “nite”. Os embalos passaram a ser baladas. A nova revolução sexual contou com a liberação cada vez maior da atitude GLS, o que fez com que tudo ficasse mais democrático. Mas não se pode fumar e os motoristas não bebem. Prazeres noturnos que perderam a liberdade. E as festas tomaram o lugar dos clubs. Exemplo da de sábado. Em São Paulo mesmo, não se abre um novo club, uma nova balada há meses. O hype são as festas que a gente seleciona pela internet. As festas estilo sunset, que começam no final das tardes dos finais de semana, se tornaram o grande barato tanto para patricinhas como para os hipsters, o povo modernette. O que importa mesmo é sempre abrir as asas e cair na gandaia.
Por redação
Edição Kelly Saito
Fotos divulgação
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Olá, gostei muito do seu artigo, aguardo mais novidades. Para mim, que estou começando agora, suas dicas foram muito importantes.